sábado, 16 de abril de 2011

A TRAGÉDIA DO REALENGO

A reedição da  temática do bullying
                                                                  * Por  Cláudio  Silva
O  triste  e lamentável  episódio da  escola  do  Realengo  vitimando  fatalmente  12  adolescentes, mais  uma  vez  colocou a  sociedade brasileira em estado  de  alerta. Inclusive  com repercussão internacional. Um aspecto chamou a  atenção, a recorrência  do fenômeno bullying abordado semanas  atrás  nesta coluna em nossa crônica  O “Morro dos Ventos Uivantes” e o bullying! , e  que  recomendamos reler. As  análises  do caso que  tem sido  apresentadas  por  autoridades  policiais  e  especialistas, sobretudo  nas  áreas  da  psiquiatria  e  psicologia, dão  conta de  que  não  é  possível  prever atos  perpetrados  por  uma  mente  desequilibrada. No entanto, uma  situação  é fato, o  criminoso foi  vítima  de  bullying quando estudou naquela mesma escola. Retomemos alguns  trechos  de  reportagens veiculadas  nos  últimos  dias:

-Em anotações encontradas pela polícia em sua casa, o atirador Wellington Menezes de Oliveira, 23, pôs a culpa pelo massacre em Realengo nos que o humilharam na escola na adolescência. Os manuscritos foram exibidos ontem à noite no "Fantástico", da Rede Globo. [...] Muitas vezes, aconteceu comigo de ser agredido por um grupo e todos os que estavam por perto debochavam, se divertiam com as humilhações que eu sofria sem se importar com meus sentimentos", escreveu ele. ” (  Folha  de  S.  Paulo  11. 04. 2011);

- “Eu me lembro muito, o Wellington era o ‘bundão’ da turma, era um cara totalmente tranquilo, um bobão. Implicavam bastante com ele, zuavam ele de tudo o que é nome”, contou Bruno. Mas depois o jovem ressaltou: “Ele apesar de ser bundão, ele tinha um sorriso assustador”. (  Portal  G1 08.04.11)

- “O professor Glenn Stutzky, da Universidade de Michigan State (EUA), analisa que pessoas que tenham sido vítima de bullying na escola, podem praticar atos de violência no futuro, desencadeados por outros fatos”. (  Folha  de  S.  Paulo  15.04. 11)

É consenso que  nada pode  justificar atos  de  violência, e suas  raízes devem ser  combatidas com o seu  antídoto. Assim, é imperioso  que  a  sociedade, para poder fazer o seu enfrentamento, se  una no  sentido  da promoção de uma educação para  a  paz, e para  a promoção de relações humanas fraternas. Um trabalho de  humanização que seja iniciado na  família, e perpasse as demais  instituições  sociais fundamentais. E  que seja  assumido  pelos seus  principais  atores. Neste sentido a  escola é o  locus  por  excelência para  a  promoção e  aprofundamento desse processo, de, quem sabe, reeducação humana. Talvez seja este  o  termo  mais  apropriado.

 Mas para  que  isso seja possível, é  necessário superar todo e  qualquer entrave, inclusive barreiras de caráter ideológico. Digo  isto  baseado em um fato que  ocorreu comigo no ano  passado, em Curitiba, na  etapa  estadual  da  Conferência  Nacional  da  Educação ( CONAE). Apresentamos a  proposta da inserção da educação  para  a  paz  nos  currículos  escolares. Para que  constasse  no documento final que  seria  encaminhado  posteriormente para  a etapa  nacional   da  conferência, e a  partir  do  qual seriam delineadas as propostas  para a elaboração do  Plano Nacional  de  Educação ( PNE).  A sugestão foi motivada  por uma  sequência  de  fatos, à  época,  envolvendo  agressões a professores e estudantes  em Londrina - Pr, inclusive  com o  seqüestro  de  uma diretora  por  alunos. A proposta , por  questões  ideológicas, dividiu  as  opiniões  da  plenária, sendo  levada  a  votação. E, pasmem, a educação para  a  paz foi  voto  vencido! Por  uma  pequena  margem de  votos, mas o  fato  é que foi recusada. Argumentos contrários, comentados depois “a  boca pequena”, eram de  que iniciativas dessa  natureza se  identificam com práticas  apregoadas  pela política  neoliberal. Curiosamente, a  mesma  cidade  de  Londrina, há poucos  dias  frequentou  novamente  os  noticiários  com graves  fatos  de  violência em escolas. Às  vezes a estreiteza das diferenças humanas, impede a  percepção de questões maiores e fundamentais. E a  política tem sido campo  fértil para  esses radicalismos  que  têm custado tão  caro  à  sociedade.

Importante, em  momentos como  agora, em  que  somos  sacudidos  por  fatalidades carregadas  de  extrema  violência, repensar a educação dos nossos filhos. E  tomar  consciência de  que  os “freios morais” que norteiam e equilibram a  ação  humana precisam ser  repensados e revalorizados. Um deles é a  fé, cuja crise moderna se  traduz no  distanciamento do primeiro mandamento, ou na sua redução  a práticas fanatizantes e/ou desencarnadas  da  realidade. Desde  a  antiguidade a  Regra  de  Ouro  tem sido uma ótima  referência  moral, amar ao próximo como a  si  mesmo.

O mundo voltado para o individualismo é um mundo que não cria fraternidade. Michel  Quoist, escritor  francês, indica que reconstruindo o  homem, estaremos  reconstruindo  o  mundo. E  que a  reconstrução  do homem passa pela reconstrução  de relações fraternas. Constatação tão  antiga e  tão atual, e  historicamente relembrada  por personagens  que  marcaram a humanidade como Jesus Cristo, Confúcio, Ghandi, Luther King e tantos outros. Finalizando, algumas frases da  emblemática “Blowin In The Wind”, de Bob  Dylan: “Quantos  caminhos um homem  deve  andar, para que possa  ser  chamado  de  homem? Quantas mortes  ainda  serão  necessárias, para  que  se  saiba  que  já  se  matou  demais?  Quanto tempo  um homem deve  virar  a  cabeça, fingindo  não  ver o  que  está  vendo?”.

                        Um abraço e uma  boa semana!

*Cláudio Silva é mestre em Educação, Secretário de Educação de Apucarana-PR e ex-  presidente da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação-UNDIME/PR.                                                    ( mais textos do  prof. poderão  ser  acessados em http://profclaudiosilva.blogspot.com)


Ficha Técnica:
Estrutura: Cláudia Alenkire Gonçalves da Silva (acadêmica de jornalismo)
Revisão: Prof.ª Doutoranda Leila Cleuri Pryjma

Acesse a mais recente crônica do  Prof. Cláudio Silva  “Tá faltando tempero, Zé!"! clicando: http://profclaudiosilva.blogspot.com/2011/08/ta-faltando-tempero-ze.html.

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