*por Cláudio Silva
Neste momento o mundo está com os olhos voltados para o Japão.
O alerta nuclear, tantas vezes observado, foi soado. Autoridades vão dosando a dimensão da catástrofe, ampliando-a gradativamente a cada novo anúncio. O perigo atômico passa de hipótese a realidade, principalmente quando relembram outros eventos, como o de Chernobyl, na Ucrânia (1986), considerado o maior acidente nuclear da história, e o de Goiânia (1987), no Brasil, que expôs um número considerável de pessoas ao Césio-137, resultando em 64 mortos e 628 pessoas contaminadas , de acordo com o Greenpace.
A confluência de fatos: tremor, tsunami e perigo nuclear, retoma o tema, sempre presente e novamente proposto pela Igreja Católica para reflexão durante a Campanha da Fraternidade, respeito ao homem e à natureza.
Enquanto escrevo este artigo, leio no site da UOL a manchete “Medo da radiação provoca fuga de moradores e turistas de Tóquio”. Notícia que, somada às imagens do terrível tsunami, somente poderia ser imaginada a bem pouco tempo, apenas no terreno da ficção. Cenas tão impactantes pelo realismo das transmissões que tem vindo do Japão, que no final de semana minha filha Kiki perguntava à mãe se as previsões do filme 2012 (2009), do diretor Roland Emmeriche, já estavam se cumprindo, tal a semelhança.
Coincidentemente, justamente um cineasta japonês Akira Kurosawa (1910-1998), foi quem produziu os mais contundentes alertas quanto ao perigo nuclear, em obras memoráveis como Sonhos (1990) e Rapsódia em Agosto (1991). Filmes que por um bom tempo utilizei nas aulas de Ética para discussão com os alunos e que recomendo para reflexão nestes dias.
No filme Sonhos, idealizado a partir de sonhos reais que Kurosawa teve, são apresentados oito episódios isolados, oito sonhos como pequenos “filmetes”, mas que guardam relações entre si. Dois episódios abordam o perigo nuclear e possíveis conseqüências. Um deles, Monte Fuji em Chamas, aborda coincidentemente a explosão de três usinas nucleares no Japão e as fumaças da radiação que causam câncer, mutação e morte. O diretor procura associar a beleza à imprudência do homem. Em outra seqüência, denominada O Demônio Que Chora, projeta hipoteticamente o sofrimento causado por mutações genéticas derivadas da radiação, que transformam os seres humanos em criaturas de aparência horripilante e com atitudes bestiais, que se entredevoram na luta pela sobrevivência, num mundo que não mais consegue produzir alimentos. E finaliza com a seqüência bucólica denominada O Vilarejo dos Moinhos, em que procura resgatar a singeleza da vida do homem em harmonia com a natureza, consigo mesmo e com os seus semelhantes.
Lembro-me de que quando projetava essas cenas para os alunos, elas sempre causavam impactos e calorosos debates. Mas tudo o que se discutia à época parecia algo distante e com possibilidades remotas de efetivamente ocorrer. Hoje vemos que não. A “natureza em fúria” tornou-se fato recorrente. No Brasil e no mundo recentes ocorrências vão se sucedendo de forma assustadora com uma infinidade de vítimas. Aqui ainda vivemos os impactos das últimas enchentes em São Paulo, soterramentos na região serrana do Rio de Janeiro e Santa Catarina, seca no Rio Grande do Sul, mortandade de peixes nos rios da Amazônia e as atuais enchentes no litoral paranaense. Apenas para citar.
Os alertas dos cientistas vêm de há muito. Assim como de personalidades como Al Gore que produziu o instigante documentário “An Inconvenient Truth” (Uma Verdade Inconveniente) sobre o aquecimento global e suas conseqüências. Nele, ele antecipa cenas que estão sendo apresentadas nestes dias na TV, ao mostrar o que acontecerá às regiões costeiras dentro dos próximos anos com a elevação do nível do mar causado pelo derretimento das geleiras.
Quais as constatações a que podemos chegar? Penso que a humanidade não padece mais de falta de informações e alertas, mas de gestos individuais e coletivos que demonstrem conversão, mudança verdadeira de atitudes. É como o caso das campanhas sobre os perigos do tabagismo, alcoolismo ou a violência no trânsito. Paradoxalmente crescem as estatísticas de pessoas que continuam morrendo por causa do cigarro e direção irresponsável.
A mudança verdadeira começa por mim e por você, a partir de pequenos gestos que demonstrem uma mudança radical de procedimentos, de respeito pela vida, respeito para consigo mesmo, aos nossos semelhantes e à natureza. Pequenos gestos, que somados, constituem-se numa verdadeira revolução pela vida.
Finalizo recordando a antológica “Rosa de Hiroshima”, poema de Vinícius de Moraes, musicado por Gerson Conrad e sucesso na voz de Ney Matogrosso: “Pensem nas crianças mudas telepáticas/ pensem nas meninas cegas inexatas/ pensem nas mulheres rotas alteradas/ pensem nas feridas como rosas cálidas/ Mas, oh, não se esqueçam da rosa, da rosa/ Da rosa de Hiroshima a rosa hereditária/ A rosa com cirrose a anti-rosa atômica/ sem cor sem perfume sem rosa sem nada”. Na missa de domingo o Monsenhor Carrara recordava o adágio popular: “Deus perdoa sempre, o homem às vezes e a natureza nunca”. Será que ainda dá tempo?
Um abraço e uma boa semana!
*Cláudio Silva é mestre em Educação, Secretário de Desenvolvimento Humano de Apucarana-PR e presidente da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação-UNDIME/PR.
Ficha Técnica:
Estrutura: Cláudia Alenkire Gonçalves da Silva (acadêmica de jornalismo)
Revisão: Prof.ª Doutoranda Leila Cleuri Pryjma
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