sábado, 21 de abril de 2012

CRÔNICA- "VAMOS COMIGO, FILHO!" – uma reflexão sobre a pós-modernidade


  *Por  Cláudio  Silva

Esta, contou-me  um amigo. Aconteceu  no  contexto  católico, mas  poderia  muito bem ter ocorrido  no  contexto de  outras religiões. Semana Santa, Quinta-feira , à  noite, –  diálogo  de  um casal:

- Ela:  “Vamos  à igreja participar da cerimônia do lava-pés” ?
- Ele:Vamos sim”.
- Ela: Chame  o  Júnior  então’.
- Ele: Ele  não vai, foi à  casa  da  namorada. Ela vai passar o  dia fazendo um trabalho  para  a faculdade  amanhã, e  eles  vão aproveitar  para  ficar  juntos  hoje”.
Os  outros  dois  filhos do  casal  estudam fora.
- Ela:  “É, pelo  jeito  as  tradições religiosas  das  nossas  famílias terminam  em nós  dois”.
           E  seguem, os  dois,  para  a  igreja.

           Sexta-feira Santa, nove  horas da  manhã , novo diálogo:
-  Ela:Vamos à  cerimônia de adoração” ?
- Ele:Pode  ir  você, preciso  concluir  um trabalho acadêmico, urgente. Se eu  for  não  vai dar  tempo”. Diz, lamentando-se.
-Ela: “Quem sabe  o  Júnior  vai  comigo  então”.
- Ele: “Isso, convide-o. Assim você  não  vai  sozinha”.

Ela  vai  ver o  filho  no  quarto, que dorme  profundamente. Fica  com pena de acordá-lo, pois tem estudado  muito  para  o  vestibular. Resolve ir sozinha, e no  caminho  vai  pensando em como  a  vida  mudou, alterando costumes  e  tradições e  distanciando até  as  pessoas mais  queridas. A fé aparentemente parece não ser  mais o maior ou um dos  grandes ponto  de  unidade familiar e  consequentemente, social. Uma realidade que choca e assusta muitos , mas  é a  constatação  de  que as  coisas realmente mudaram. 

Em   um email de  felicitações de  Páscoa uma minha prima lamentava-se: “ ... as pessoas perderam o brilho do espírito de páscoa, natal, e outros eventos religiosos!!! infelizmente, estamos esquecendo tudo o que nos foi passado pelos nossos pais......” .  O que  aconteceu? As  pessoas  de repente perderam a  fé ou  o  amor familiar? Estou convicto que  não. Vivemos  novos tempos, uma  nova  era que  impõe  novas formas de expressão e de  relações. Nas gerações anteriores, como nos tempos  dos  nossos  pais,  vivia-se  mais  coletivamente. Em família tomávamos  as  refeições, assistíamos tv, íamos  ao  cinema,  frequentávamos  a  igreja, viajávamos. Diferentemente de hoje em que as  expressões  tendem a  ser  cada  vez  mais  individuais, mesmo nas  manifestações  de  fé  e  tradição. 

O mundo está imerso no  individualismo.  Já reparou nas  ruas, quantos carros  enormes com vários  lugares, e os condutores praticamente sozinhos? Fui resgatar alguns apontamentos sobre características deste  tempo  que  a  filosofia denomina de pós-modernidade. Ele é definido  como um tempo de  incertezas, troca  de  valores, desconstruções e fragmentações.  Uma  de suas  marcas  mais inquietantes  como  dito antes é o individualismo.  À  ele  some-se a superficialidade e a falta  de  profundidade. Igualmente, o  imediatismo, de não se pensar mais em termos de futuro, mas de aqui e agora. Outras características são a moral utilitarista, o conflito de gerações e  a provisoriedade, onde nada  mais  é considerado  definitivo. Pode-se inferir que esses aspectos  somados criam  um quadro  de  crise, se esta  for entendida como  choque  de  mudança.

São transformações profundas trazidas pela pós  modernidade, que  modificam as  estruturas e as  aparências. Pode-se destacar à  guisa de  reflexão, dentre  outras, duas  dimensões  dessa crise, a  social  e  a religiosa, aproveitando o fato que  deu origem à  esta reflexão. Na  primeira , a  social, alguns  dos  aspectos observáveis são  a desintegração  dos  papéis e um  mundo  que  não  mais  cria  fraternidade  por  estar voltado  para  o  individualismo. Da mesma forma pode-se observar o imediatismo, que nos condiciona a focar mais o  quotidiano  e  não  mais o amanhã. A falta  de  modelos exemplares e  confiáveis  de  vida é  outra  característica herdada  da pós modernidade. E na crise religiosa, pode-se observar dentre  vários  aspectos a  volta  aos  fundamentalismos, a substituição de vivências  coletivas  de  fé  e  religiosidade por formas  individualistas do  tipo ‘Eu  e  Deus’ , com a ênfase no alcance de  necessidades  pessoais imediatas e não  mais  no  “Deus  no  irmão”.

Ou  seja, na  pós-modernidade saímos  do mundo  do  NÓS  para  o  mundo  do  EU. E nessa nova  realidade, mesmo as relações  coletivas tendem a ser  feitas  por  meio  de  canais “individualizantes”. O solitário pode estar conectado através de redes de relacionamentos à um número  incontável de contatos, em sua maioria anônimos  e/ou  distantes. Um coletivismo individualista, se  isto  for  possível. Laços frágeis e  superficiais.

Estamos  ainda  engatinhando  e  meio  aturdidos na  vivência  desses novos  tempos, e  a  atitude mais sábia  parece ser a  de tentar harmonizar  essas novas realidades com as oportunidades de  convivência fraterna  que  surgem a  cada  dia.

 Pode ser considerada uma pessoa sábia hoje aquele e aquela que é capaz de buscar incessantemente o equilíbrio dentro dessa nova  realidade, principalmente no âmbito da família.  Eis o desafio permanente. É fácil?  Creio  ser  esse  o  verdadeiro  leão  a ser  enfrentado a cada  dia.

Novos tempos trazem consigo novos desafios, que  pedem novos olhares e novas  atitudes. 

Um abraço!

*Cláudio Silva é mestre em Educação, Secretário Especial de Ensino Superior de Apucarana-PR e ex- presidente da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação-UNDIME/PR.  

                                                                                                                  
Ficha Técnica:
Estrutura: Cláudia Alenkire Gonçalves da Silva (acadêmica de jornalismo)
Revisão: Prof.ª Doutoranda Leila Cleuri Pryjma

PARA REFLEXÃO:  CRÔNICA- "VAMOS COMIGO, FILHO!" – uma reflexão sobre a pós-modernidade   - nova  crônica  do  Prof.  Cláudio  Silva 


Mais crônicas do  Prof. Cláudio  Silva em:    http://profclaudiosilva.blogspot.com.br/2011/10/cronicas-sobre-educacao-do-prof-claudio.html

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